Quantas galáxias além da Via Láctea existem no universo?Maior mapa 3D de galáxias já criado ajudará a entender como elas evoluem
Em junho deste ano, foi lançado o Data Release 3 (DR3) da missão Gaia da ESA, incluindo informações sobre inúmeros de objetos de nossa galáxia. Este lançamento, em especial, foi o primeiro a incluir alguns dos espectros luminosos reais de 220 milhões de objetos astronômicos. Os espectros são a principal ferramenta dos astrônomos para encontrar informações sobre a composição química dos objetos cósmicos. Dependendo dos elementos presentes na atmosfera de uma estrela, por exemplo, é possível estimar sua idade. Na época em que as primeiras estrelas se formaram, o universo ainda era composto essencialmente por hidrogênio e hélio, uma característica que os astrônomos chamam de “baixa metalicidade”. À medida que as estrelas enriqueceram o cosmos com outros elementos por meio da fusão nuclear, o universo se tornou cada vez mais rico em metalicidade (sim, na astronomia todos os elementos além de hidrogênio e hélio são considerados metais). Quando uma estrela massiva explode em supernova, ela libera os elementos fundidos em seu núcleo. As estrelas explosivas são principalmente as gigantes azuis, que duram pouco tempo mas conseguem fundir muito mais elementos pesados que uma estrela pequena como o Sol, inclusive o ferro. Por isso, a presença ou ausência de elementos mais pesados (ou mais metálicos) é um indicativo de idade da estrela. Afinal, espera-se que estrelas muito antigas tenham baixo índice de metalicidade em seus espectros. Foi essa a abordagem usada para encontrar o “pobre velho coração” da Via Láctea. Considerando que se tratam de estrelas muito velhas e pobres em metalicidade no centro galáctico, o apelido faz bastante sentido. Para essa análise espectral, os cientistas tiveram que superar um problema com os dados do Gaia: devido ao próprio design do observatório espacial, a leitura de espectro luminoso das estrelas é de baixa resolução. Por isso, os astrônomos usaram o aprendizado de máquina para analisar os dados. Assim, eles aplicaram um algorítimo aos dados das estrelas gigantes vermelhas na região central da Via Láctea registradas pelo Gaia. Com os resultados, os pesquisadores tiveram acesso a uma amostra de 2 milhões de gigantes vermelhas no interior da galáxia e seus dados espectrais, com precisão sem precedentes. O resultado mostrou que essas estrelas são muito pobres em metalicidade e, portanto, muito antigas — mais precisamente, o “coração” galáctico tem mais de 12,5 bilhões de anos. Isso é compatível com as simulações que descrevem a formação e evolução das galáxias.
Simulações da evolução das galáxias
Nossa galáxia tem cerca de 13 bilhões de anos, mas sua formação envolveu a fusão de três ou quatro proto-galáxias. Logo após, suas estrelas se estabeleceram como um núcleo compacto de alguns milhares de anos-luz de diâmetro. As simulações mostram que parte desse núcleo inicial sobreviveria à medida que as estruturas da galáxia evoluíam. Por isso, os astrônomos tinham a expectativa de encontrar aquelas estrelas muito antigas do núcleo compacto inicial. Com o novo estudo, os cientistas encontraram dados muito consistentes com o fato de essas estrelas terem se formado após a fusão das protogaláxias, e não vieram de galáxias anãs que colidiram depois com a Via Láctea. Ainda há muitas perguntas aguardando respostas, mas a descoberta do “pobre velho coração” da nossa galáxia é um passo a mais para desvendar a história da Via Láctea. Os próximos levantamentos de dados podem revelar quais estrelas na região do núcleo pertencem a qual das proto-galáxias que se fundiram para formar a Via Láctea que conhecemos hoje. Os resultados do estudo foram publicados na Astrophysical Journal. Fonte: The Astrophisical Journal